ACTA do LIII CAPÍTULO GERAL da idade Tarentiana Criado por jvieira em 02/11/2021 22:32:36 ACTA do LIII CAPÍTULO GERAL da idade Tarentiana- " A Primeira Dinastia do Reino Maravilhoso. I. Acto: O Festim do Galo Montês."
ATA de l LIII Capítulo Giral de l'eidade Tarentiana – “La Purmeira Dinastie de l Reino Marabilhoso. I Ato L Festin de l Galho Montés”.
Pois mil anos aos teus olhos são como o dia de ontem que passou ou uma vigília da noite.
Salmos 90:4 do Grande Rolo de Papiro da Judeia.
Após uma frutífera caçada de Auroques, na véspera da 1.ª lua após o dia em que ele mesmo foi do tamanho da noite, antes das neves do ano de 2019 da cultura Solutrense, na Foz do Ribeiro Sagrado, conhecido em outras dimensões temporais por Coa, reuniu-se em Capítulo a Confraria dos Amantes das Xixas e da Poção das Ânforas das Terras de Além Montes e Riba Douro, abreviadamente denominada Confraria, presidido pelo Mui Respeitável Grão-Mestre. Da ordenança da assembleia magna da confraria constavam os seguintes pontos:
- Leitura e votação da Acta do Capítulo realizado há doze luas e meia;
- Rituais de Entronização e Confirmação;
- Outros assuntos
Como já é habitual, a reunião magna da Confraria iniciou-se com bastante atraso, de mais de um décimo do dia. O maior motivo desta vez resultou do desvio de atenções de vários confrades por parte do confrade de sua graça Francisco, distinguido dos demais chicos por Ribeiro, nome com origem na sua vesânia de talhar nas fragas das margens do Ribeiro Sagrado os frutos das nossas caçadas. Em resultado de utilizar as pedras das pontas das lanças para esculpir as suas obras, entre muitos outros e outras artistas, é muitas vezes criticado por aqueles que se esforçam arduamente por nos proporcionarem grandes repastos, sobretudo os que perseguem os Auroques, já que veem as suas ferramentas de trabalho serem monopolizadas por este nosso confrade, para gravar os animais nas rochas. No entanto, desta vez, houve uma agradável surpresa do resultado das suas marteladas que despertou a atenção de um número significativo de confrades, inclusivamente os caçadores-recolectores. Efetivamente, sempre com o sol matinal a incidir sobre as rochas, o nosso confrade consegui evidenciar na pedra o movimento do grande Bovino ao ser atingido mortalmente pela lança atirada pelo Grão Arquimagiro Bessa, cognominado Guerra pela sua valentia e, que, entretanto, estava já com duas pedras na mão para atear o fogo que permitirá preparar o galo montês que será degustado pelos confrades após a realização da assembleia magna.
Entrementes, a nossa Grã Druida Celeste, cognominada assim por nos trazer o céu à terra, estava já a escolher as ânforas com a poção sagrada para o nosso repasto, tendo selecionado o das bagas recolhidas na Penascosa, mas que não as de ervamoira, para a cerimónia de confirmação que iria ocorrer daí a minutos. Neste entretanto, estavam já mais dois alquimistas a colher umas folhas de outras plantas endeusadas cujo relato da história não é oportuno aprofundar para que esta introdução ao capítulo não torne a ata fastidiosa.
Assim, o Mestre dos Festins e dos Rituais Mágicos anunciou a abertura, em nome do Mui Respeitável Grão-Mestre, do Capítulo da Estação que Despe a Faia, passando ao ponto um da ordem de trabalhos, tendo o Grão-Escriba procedido à leitura da Tábua onde foi registada a Ata do Capítulo anterior. Após sujeita a votação, a mesma foi aprovada pelos confrades.
Coube ao Mestre dos Festins e dos Rituais Mágicos anunciar a única entronização proposta por dois confrades e aprovada pelo Conselho de Anciãos, de seu nome Maria José cognominada de Santos por os seus ancestrais terem as suas origens num outro vale, também ele sagrado, situado proximamente, em Baldoeiro, a não mais de 5.000 auroques de distância, terra do Mui Respeitável Grão-Mestre. A confrade defendeu o merecimento de pertencer à confraria, com o desenvolvimento do projeto 4 ventos, uma oficina de comunicação que revolucionará a forma de promover a cultura e os produtos deste reino maravilhoso, o que deixou o nosso esculpidor Chico preocupado com o futuro da sua profissão ligada às artes. O Grão e a Grã-Mestre esboçaram um grande sorriso e tranquilizaram o nosso confrade artista, referindo-se que tinham a convicção que daí a 250 mil luas, se eventuais alterações climáticas não fizessem subir a água do rio e inundassem as gravuras, a sua obra, certamente, ainda viria a ser apreciada pelas gentes de bom gosto.
Encerrando o segundo ponto da agenda o Grão Orientador dos Bons Caminhos procedeu ao acto solene de juramento da confrade entronizada, exaltando-a mais uma vez para a defesa intransigente das xixas e da poção dos bagos fermentados a que as gentes das Terras de Além Montes e Riba Douro tão laboriosamente as produzem.
O Capítulo aprovou por unanimidade a confirmação, a que se seguiu o brinde, com as tradicionais cristas do galo montês, degustadas conjuntamente com a poção da ânfora selecionada pela Grã Druida.
Competiu ao Mui Respeitável Grão-Mestre comunicar um conjunto de notícias, iniciando-se por uma sentida homenagem ao Cronista Rogério Rodrigues, também ele apreciador da bebida dos deuses, sobretudo a mais forte, originaria das Terras Altas da grande ilha verdejante. Aflorou o seu percurso profissional, a sua importância no jornalismo de investigação que deu a conhecer como alguns seres humanos são capazes de desafiar os deuses subjugando o seu semelhante a maus-tratos e à miséria, cousas de outros reinos. Contou a origem, na crónica do Rogério, da canção Teresa Torga do famoso trovador Zeca Afonso cuja história era desconhecida da generalidade dos confrades.
A terminar a sua intervenção, o Mui Respeitável Grão-Mestre anunciou, para daí a 6 luas, o arranque das comemorações das 300 luas da Confraria e que, se o céu não cair em cima de nós todos, iniciar-se-á na Foz do rio de um outro Vale Sagrado, o Águeda, e que desagua igualmente no Rio de Ouro, que também têm artistas como o nosso Chico, mas que falam uma língua diferente da nossa e, diga-se em abono da verdade, as suas marteladas não têm tanta qualidade.
Após o agradecimento ao presidente do acampamento do Vale Sagrado, Fernando Fachada, o Grão-Mestre passou a palavra ao nosso anfitrião Bruno Navarro, Presidente da galeria de arte do acampamento, para apresentar os diversos projetos que estão em marcha e que perpetuarão no tempo a cultura deste vale, sem antes se comprometer a regressar para um capítulo noturno, tal como sugerido pelo próprio anfitrião.
Bruno Navarro começou a sua intervenção por tecer um elevado elogio aos artistas que desenvolvem a sua atividade nas fragas do Vale Sagrado e à cultura deste nosso povo que permite criar este ambiente tão propenso à magistralidade. Relembrou que na história sempre houve e haverá humanos que valorizaram o material e o efémero, ao contrário dos que procuram o alimento para alma. É destes últimos, os sonhadores, que a imaginação acontece e a obra nasce. Os que são relembrados ao longo dos tempos. E nesta perspetiva contou o seu grande sonho, que se iniciou por um pesadelo. Que viria alguém que queria construir no rio sagrado um muro tão alto que a água iria subir e inundar as gravuras. Que os povos iriam fazer tão mal à natureza a ponto dos deuses se enfurecerem e fazerem subir a temperatura, derretendo o nosso glaciar da Serra da Estrela e todos os glaciares do mundo, a ponto do mar subir tanto que entraria pelo Rio de Ouro e viria inundar as nossas gravuras. Mas com a ajudas dos nossos jovens estudantes, sempre críticos e imaginativos na forma de comunicar, o bom senso iria prevalecer, e triunfaria quem respeitasse o facto das gravuras não saberem nadar. Viria um salvador. Alguém com poder que iria mandar suspender a construção do muro. Que, mais tarde, aconselhando todos os povos do mundo, iria liderar o triunfo dos que, tal como nós, respeitam a natureza, que vivem com ela e não contra ela, que nunca a abandonam. E, assim, iriamos continuar a poder brincar na neve das serranias e a disfrutar destas obras de arte neste nosso Vale Encantado. Nesse futuro muito longínquo, quiçá daqui a 250 mil luas, todos os povos do mundo saberiam valorizar os feitos dos artistas do Vale Encantado. Não só os do Coa como os do Águeda, das Terras de Siega Verde, unindo estes dois povos irmãos num único Património Mundial Transfronteiriço. Nesse sonho, a nossa galeria era transformada em Museu do Coa, onde os visitantes pudessem desfrutar não só das nossas obras de arte, mas também da sua interpretação, do conhecimento dos nossos povos, dos nossos costumes, do carinho que damos à confeção das nossas xixas e das nossas poções. Uma verdadeira alavanca da sustentabilidade deste território de paisagens deslumbrantes.
Ao descrever esse sonho, começou por se referir que a arte do Vale Encantado é única no mundo, e que já teve a oportunidade de visitar muitos locais semelhantes, mas a qualidade das nossas obras artísticas não tem paralelo e encontram-se disponíveis ao ar livre, onde todos os que nos visitam as podem contemplar. Ao contrário da generalidade da arte rupestre, os nossos artistas, homens e mulheres, frequentaram as melhores escolas de belas artes e desenvolveram como ninguém a técnica de esculpir na pedra o movimento e a tridimensionalidade, o que deixou o nosso Chiquinho babado de orgulho. Regressando ao seu sonho, referiu ainda que muitas obras se edificarão ao longo dos tempos no Vale Encantado. Que muitos artistas virão que utilizarão esta técnica só nossa de representar o movimento em 3D e que daí nascerá a 7.ª arte, o que deixou os confrades a pensar que, depois da dança, só se fosse uma que juntasse as 6 anteriores. Inimaginável. Bruno Navarro prosseguiu na descrição do seu sonho, referindo que, quando já fizermos parte da pré-história, se erigirá no Coa o melhor Centro Científico de Arqueologia Mundial, que desenvolverá trabalhos científicos relacionados com a nossa arte numa perspetiva de dinamização das comunidades rurais que nos sucederão, e que contemplará projetos de investigação diretamente relacionados com o estudo e preservação das obras, mas também a observação e conhecimento da terra, a origem da vida e as interações socioculturais ao longo dos tempos, a biodiversidade e a sustentabilidade dos territórios e, até quem sabe, as alterações climáticas, como as que se têm verificado neste final da Idade do Gelo, que tanto sofrimento tem causado aos mamutes.
A capacidade de comunicação de Bruno Navarro tornou curta a sua longa intervenção, escutada atentamente por todos os confrades, facilitada pela paixão com que o orador evidencia exercer a sua profissão, o que torna muito difícil resumir em acta a comunicação. Em todo o caso, convém ressaltar a visão que o nosso anfitrião tem para o Museu do Coa que, para além da conservação, investigação, difusão e exposição dos testemunhos materiais do homem e de seu entorno, para educação e deleite da sociedade, deverá ter a ousadia de proporcionar o encontro de culturas, juntando os mais diversificados artistas, a dinamização do turismo e a promoção dos produtos endógenos e a própria exportação das nossas gravuras, não fisicamente, mas levando o testemunho a outras paragens do que, certamente, deixaremos de legado. Sermos mesmo o ponto fulcral da rede da arte rupestre que tem artistas difundidos por todo o mundo nesta nossa era, sempre em benefício das gentes que habitam este território.
Após a brilhante comunicação de Bruno Navarro, o Mestre dos Festins e dos Rituais Mágicos deu por encerrada a reunião magna da Confraria, sem antes referir a ausência do Grão-Escambeiro que se encontra em parte incerta, havendo rumores de ter sido avistado pela última vez com a barba pelo meio do tronco, a perseguir um veado de lança na mão, tendo referido que seria a Grã-Mestre, conjuntamente com o alquimista Luís Esteves, a por as contas dos Confrades em dia.
E, afinal, o céu cai-nos mesmo em cima…
Vale Encantado, na primeira lua da Estação que Despe a Faia do ano de 2019 da cultura Solutrense,
O Grão-Escriba, que talvez tenha trocado a ânfora da poção da Celeste pela da maceração da ervamoira,
José Vieira.