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Acta do LVII CAPÍTULO GERAL
Criado por jvieira em 01/05/2024 12:06:38


ACTA do LVII CAPÍTULO GERAL – “Ode às artes agronómicas: A mesa no dia dos bobos"

ATA de l LVII Capítulo Giral – “Eibocaçon a las artes agronómicas: La mesa ne l die de ls bobos”

Ao primeiro dia do mês de abril do ano da graça de dois mil e vinte e três, às dez horas, acrescido de uma hora, no Salão Nobre do Instituto Superior de Agronomia, em Lisboa, reuniu-se o Capítulo Geral da Confraria dos Enófilos e Gastrónomos de Trás-os-Montes e Alto Douro, abreviadamente denominada Confraria, presidido pelo Grão-Conselheiro.

Da ordenança da assembleia magna da confraria constavam os seguintes pontos:

1.     Leitura e votação da Acta do LV Capítulo Geral de Outono de 2022, realizado em Tarouca;

2.     Entronizações e confirmações;

3.     Apresentação do Livro Plantas Tóxicas, Comestíveis e Curativas do Norte de Portugal e da Galiza de Marisa Castro e Balbina Silva

4.     Elogio de Roberto Afonso à pintura de Balbina Mendes

5.     Apologia às memórias de afirmação local e construção de novas heranças culturais.

Em resultado do Mui Respeitável Grão-Mestre ter marcado o Capítulo de Primavera para o dia dos enganos, o Grão-Chanceler adverte que a presente Ata poderá, ou não, conter referências a acontecimentos que poderiam ter ocorrido, mas que, eventualmente, na realidade, passaram ligeiramente ao lado do descrito.

Passando à descrição dos acontecimentos, em nome do Mui Respeitável Grão-Mestre, o Mestre de Ritos e Cerimónias deu início à sessão, sem antes dar as boas-vindas aos Confrades e Convidados. Começou por referir que, antes de existir Universidade em Trás-os-Montes e Alto Douro e o seu magistral jardim botânico, o magnífico salão nobre constituía o coração da escola mais bonita do mundo, rodeada pelo famigerado Jardim Botânico da Ajuda . Nessa sequência, solicitou ao Mui Respeitável Grão-Mestre que lhe concedesse 2 minutos para dar liberdade à sua nostalgia pelo facto de se encontrar no espaço de tantas saudosas recordações com mais de meio século. Relembrou a rampa da asneira, muitas vezes palco de discussões políticas, algumas com finais trágicos, também ela resultante do facto do início da construção se ter iniciado no dia 1 de abril de 1911, altura em que o bom humor do Arquiteto Adães Bermudes fez colocar o Norte onde deveria estar o Este.

Com grande orgulho pela escola, o Mestre de Ritos e Cerimónias evocou os ilustres alunos que deixaram marca na sociedade, incluindo insignes confrades, tendo omitido o Mui Respeitável Grão-Mestre no rol de gente tão ilustre. Tal partida de um de abril do Confrade de Honra e Devoção mereceu uma gargalhada generalizada. Evidenciou o facto da escola mais bonita até aos anos oitenta do século passado ter formado um conjunto vasto de ilustres cidadãos que não se destacaram apenas na sua formação de base, relembrando que a agronomia é muito mais do que um curso superior. Entre Xutos e Pontapés, relembrou a importância do Rugby na agronomia, cujo contributo para a qualificação dos Lobos para o Campeonato do Mundo não terá sido alheia.

Entrando na ordem do dia, o Grão-Chancelar procedeu à leitura da Ata do Capítulo realizado em Terras do Demo. Após sujeita a votação, a mesma foi aprovada pelos confrades por unanimidade.

Passando ao ponto 2 da ordem de trabalhos, o Mestre de Ritos e Cerimónias anunciou que o Conselho de Anciãos aprovou a admissão de dois confrades noviços apresentados por dois confrades irmãos ao Diretório de Notáveis.

Competiu a Virgílio Gomes a apresentação do candidato Paulo Amado. Começou por referir que o candidato é editor e desde 1989 gere o projeto Edições de Gosto que tem dedicado a sua existência à elevação e dignificação da gastronomia em Portugal. Entre as várias atividades desenvolvidas, Virgílio Gomes começou por destacar a revista INTER Magazine, feita pelos profissionais e para os profissionais, e que espelha a atualidade gastronómica, a par da artística e cultural. Fez ainda referência à organização do Congresso dos Cozinheiros, onde se destaca o concurso chefe cozinheiro do ano. Instantaneamente e em simultâneo, os confrades presentes lembraram-se que, se há criatura à face da terra que mereceria tal distinção, ela dá-se pela graça de António Monteiro e, estranha coincidência, trata-se do Mui Respeitável Grão-Mestre que, entre outras iguarias, é exímio na arte de cozinhar o melhor prato do mundo, a Caldeirada à Ribeireiro (que nos perdoe a Vice Grã-Mestre e as suas molejas de vitela do planalto Mirandês). A terminar a sua apresentação, O Confrade Vergílio Gomes, referindo-se a uma frase proferida por Paulo Amado e dando o mote para as tertúlias gastronómicas à hora de almoço, O “pai dos chefs” considera que o Guia Michelin perturba o bem-estar emocional da gastronomia, fazendo a ponte para as várias dimensões da gastronomia, centrada sobretudo nas emoções e nas pessoas, à qual não deverá ser alheia uma outra face da mesma moeda que é a condição de Paulo Amado ser também um conceituado músico.

Seguidamente, Balbina Mendes, apresentou na língua mirandesa o proponente a confrade noviço Roberto Afonso. Embora a genialidade artística que Balbina emprega na sua oralidade mirandesa, à semelhança aa gravada em tela, ajudem a entender as emoções e a possibilitar o resumo desta apresentação, o Grão-Chanceler vem mais uma vez alertar para a necessidade de a elaboração das atas ser realizada por confrade bilingue. Balbina começou por realçar as qualidades do candidato enquanto vereador da cultura do Município de Vinhais e da sua empatia e empenho e motivação na difusão da cultura transmontana e que passa também de geração em geração através da sua profissão de professor do ensino secundário na área das línguas e literatura. Contudo, as qualidades que Balbina realçou perante a assembleia prenderam-se com o facto de o candidato ser Grão-Mestre da Confraria Gastronómica do Porco Bísaro e do Fumeiro de Vinhais, membro do Confraria do Butelo e das Casulas de Bragança e da Academia Ibérica da Máscara. Tem feito da sua extraordinária coleção de máscaras que foi adquirindo aos artesãos a divulgação aquém e além-fronteira desta tão sublime arte da Região de Trás-os-Montes e Alto Douro e que a nossa Confrade Balbina Mendes tão bem tem sabido evidenciar nas suas obras de arte.

Findas as apresentações, o Grão-Conselheiro, após ter recebido a palavra do Mestre de Ritos e Cerimónias, começou a conduzir a cerimónia de juramento dos entronizados, na qual se comprometeram a respeitar os estatutos, regulamentos da confraria e as determinações do Mui Respeitável Grão-Mestre, promober ls binos, la gastronomie i la cultura strasmuntanas i a renegar a to l tipo de quemidos i bubidas que nun ambolban arte, culidade, prazer i tranquelidade na sue degustaçon.

Seguidamente tomou da palavra o Mui Respeitável Grão-Mestre para a apresentação do Livro Plantas Tóxicas, Comestíveis e Curativas do Norte de Portugal e da Galiza de Marisa Castro e Balbina Silva. Começou por referir a simbiose perfeita das autoras, Balbina, uma sábia mulher do povo em plantas tóxicas, curativas e comestíveis silvestres e Marisa, uma descendente de curandeiros, cientista-estudiosa delas, que as analisa com o conhecimento e rigor botânico e científico. A propósito desta simbiose, a autora vincou o que de comum tem a Galiza e Portugal, que vai muito para além do percecionado por muitos portugueses. A este propósito prometeu que o seu próximo livro será escrito na língua mirandesa. Sendo descendente de curandeiros, a autora evidenciou na sua apresentação o amor que tem pela medicina popular, pelas plantas medicinais e que, pelos seus conhecimentos académicos e científicos, aliados à elevada sabedoria popular de Balbina, conseguiu criar uma obra que poderá permitir a valorização de tão importantes recursos endógenos, com a segurança de ter aliado o conhecimento científico aos efeitos benefícios e prejudiciais na utilização das plantas silvestres autóctones destes territórios transfronteiriços.

Passado ao ponto 4 da ordem de trabalhos, o Mestre de Ritos e Cerimónias anunciou a apresentação da Segunda Pele de Balbina Mendes por Roberto Afonso, recém entronizadoe o seu fascínio pela máscara, que se ocultam e denunciam, se obliteram e se revelam nesta série de pinturas da magnificente artista plástica. As suas fortes raízes transmontanas tornam a sua obra uma fusão perfeita entre a herança cultural e a contemporaneidade, tendo indo mais longe nesta segunda pele pela sua capacidade de harmonizar materiais, pintura e literatura, através dos poemas de autores de língua portuguesa e mirandesa, nomeadamente de Fernando Pessoa e das suas vinte e cinco máscaras que a maioria de nós só conhece quatro e de Francisco Niebro, a máscara perfeita de Amadeu Ferreira. Por proposta do Diretório de Notáveis, ficou já no currículo gastronómico e enófilo do Confrade Noviço, o brilhante texto dedicado à pintura de Balbina Mendes e como tal, a sua primeira prova de dedicação à confraria, indispensável para a sua confirmação de confrade noviço.

Como não podia deixar de ser, competiu ao Mui Respeitável Grão-Mestre o momento alto das tertúlias literárias do capítulo com a sua apologia às memórias de afirmação local e construção de novas heranças culturais, último ponto da agenda. O brilhantismo da sua explanação veio trazer à tona o significado da realização do capítulo na tal melhor escola agronómica do mundo que ladeia o Reino Maravilhoso, a sua relação com as próprias origens da confraria e o facto do Grão-Mestre da nossa confraria dar pela graça de António Monteiro e, não menos importante para esta balada astral, o apogeu da cozinha transmontana moderna ser alquimiada por duas ilustres chefs, a consagrada Justa Nobre e a aclamada Dina Morais. De facto, ser agrónomo é ter amor pela terra, pelo que ela produz, pelo saber granjear, pelo saber esperar, pelo apreciar gustativo dos frutos colhidos, sólidos e líquidos, e, acima de todo, ter uma enorme paixão pela cultura das gentes que tão sabiamente os produzem e os transformam, e pela mesa, e pela tertúlia em seu redor. Foi a combinação astral entre a paixão pela agronomia e as noites de tertúlia nessa Lisboa pré e pós-revolucionária que no 2.ª metade dos anos 70 e 1.ª dos 80 do século passado levaram o Mui Respeitável menino estudante de agronomia a cruzar-se com o jornalista Rogério Rodrigues e a percorrer muitos espaços gastronómicos em que a rapariga da sua terra, Chamada Justa Nobre, já ganhava fama nessa capital de emoções, conspirações, tertúlias e jantaradas, recordando o muito recente Prémio Carreira 2023 do Guia Boa Cama Boa Mesa atribuído no âmbito das comemorações dos 50 anos do jornal Expresso. E foi neste cósmico vagar dos astros a conspirar que Dina e Joaquim Morais tomaram conta da Taberna do Carró, que nesse tempo era gerida pelo pai de Rogério Rodrigues. O casal trouxe modernidade ao espaço, não se esquecendo de fazer renascer o conceito da velha taberna do Carró, na recuperação de receitas de outros tempos, como os espargos bravos, as esmagadas e outras iguarias da produção animal de raças autóctones, em que a D. Dina se tornou uma exímia cozinheira, para além de mestre doceira ao dominar a arte, como poucas, de dedalar as Amêndoas Cobertas do Douro.

Antes de terminar o Capítulo, o Mestre de Ritos e Cerimónias anunciou a disponibilidade do Mui Respeitável Grão-Mestre em conceder a palavra aos Confrades. Não havendo ninguém interessado, em nome do Mui Respeitável Grão-Mestre, o Mestre de Ritos e Cerimónias deu por encerrado o Capítulo de Primavera.

Tapada da Ajuda, Lisboa, na melhor escola do mundo para lá do Marão, ao primeiro dia de abril de 2023.

O Grão-Chanceler, José Vieira

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